OPINIÃO: A triste herança do FIES
Sete meses depois de o Tribunal de
Contas da União ter classificado como “descalabro” a gestão do Fundo de
Financiamento ao Estudante do Ensino Superior (Fies) pelos governos Lula e
Dilma Rousseff, a Secretaria de Acompanhamento Econômico (Seae) do Ministério
da Fazenda divulgou estudo mostrando detalhes desse episódio de calamidade
administrativa – especialmente entre 2009 a 2015 – e seu impacto nas contas
públicas.
Durante esse período, o número de
estudantes matriculados com recursos do Fies saltou de 182 mil para 1,9 milhão
– um avanço anual de 280 mil.
Os anos de maior expansão ocorreram a
partir de 2012, quando o governo aumentou indiscriminadamente o orçamento do
Fies, levando-o a oferecer crédito farto e barato a estudantes, inclusive aos
que não vinham de famílias de baixa renda.
Em 2012, foram assinados 378 mil novos
contratos. Em 2013, 560 mil. Em 2014, 733 mil. Em 2015, quando a economia já
vinha patinando e muitos estudantes já não pagavam as mensalidades, foram
firmados 287 mil novos contratos.
Além disso, o governo afrouxou as
regras do Fies, chegando a ponto de permitir que jovens de 17 anos se
enquadrassem nos critérios de renda mínima exigidos para a assinatura de um
contrato. A consequência de tanta inépcia e irresponsabilidade foi um drástico
aumento na taxa de inadimplência, que chegou a 49% dos contratos em fase de
amortização, em dezembro de 2015.
Diante de tamanha oferta de crédito,
falta de rigor para formalização de novos contratos e crescente deterioração do
cenário econômico, a maioria das faculdades e universidades privadas passou a
estimular alunos antigos e ingressantes a utilizar cada vez mais recursos do
Fies para financiar seus estudos.
Houve instituições que chegaram a
alegar a alunos de classe média que, como a taxa de juros do Fies era baixa,
para eles valia a pena assinar um contrato de financiamento estudantil e
aplicar suas poupanças no mercado financeiro.
Os números do levantamento da Seae
deixam claro que o Fies foi usado por faculdades e universidades para
transferir para os cofres públicos o risco de inadimplência de seus alunos. E
como essas instituições, aproveitando-se da falta de controle do governo,
também passaram a cobrar mensalidades mais altas dos estudantes beneficiados
pelo Fies, isso estimulou vários fundos internacionais a investir no setor
educacional privado brasileiro, entre 2009 e 2015.
Em outras palavras, travestida de
“política social” pelos governos Lula e Dilma, e concebida especialmente para
dar a ambos uma bandeira eleitoral, a oferta pouco criteriosa de crédito barato
por meio do Fies fez a alegria de muitas instituições particulares de ensino
superior, sem qualquer preocupação do governo com o que realmente importava – a
melhoria do desempenho escolar dos estudantes financiados por esse programa.
Muitas universidades privadas converteram-se em verdadeiras corporações
empresariais, com ações cotadas em bolsa.
Sucessor do programa de crédito
educativo do regime militar, lançado em 1976, o Fies foi criado em 1999 pelo
governo Fernando Henrique Cardoso. Depois de ser ampliado com muita pompa e
marketing eleiçoeiro pelos governos lulopetistas, ele se converteu num fator de
desequilíbrio das contas públicas. Entre 2010 e 2014, os gastos do governo com
esse programa pularam de R$ 1,1 bilhão para R$ 13,4 bilhões.
Para estancar a hemorragia, o governo
Michel Temer reformulou integralmente o Fies. Mesmo assim, como anunciou a
secretária do Tesouro Nacional, Ana Paula Vescovi, o órgão está sendo obrigado
a incorporar os esqueletos do antigo Fies ao resultado primário do governo.
O impacto fiscal do Fies no resultado
primário de 2016 foi de R$ 7 bilhões. E, no acumulado de janeiro a maio deste
ano, chega a R$ 1,4 bilhão. Essa é mais uma das heranças do modo como o
lulopetismo geriu o ensino superior.
Artigo publicado em "O ESTADO DE S. PAULO - ESTADÃO", em 05 de agosto de 2017.
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